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Matéria publicada em conjunto com o jornal Real Perspectiva, edição 84, de Santos/SP
Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 06/28/00 14:28:12
Análise histórica projeta o futuro de Santos 

Arquitetura, História, Arte e Informática se unem num projeto universitário

Carlos Pimentel Mendes (*)

Resgatar e analisar as tendências que determinaram a conformação atual da cidade de Santos, especialmente seu histórico relacionamento com as atividades portuárias, permitindo assim projetar seu futuro e propor um olhar sobre a cidade e seu porto, são os objetivos de um trabalho iniciado recentemente por um grupo de pesquisadores santistas que inclui historiadores, arquitetos, artistas, colecionadores de imagens antigas, fotógrafos, jornalistas e técnicos em computação, entre outros profissionais e estudantes: o projeto Portocidade, realizado em parceria entre a Universidade Santa Cecília (Unisanta) e a Fundação Arquivo e Memória de Santos. 

No dia 17 de abril, o projeto inaugurou seu site na Internet. A proposta inclui ainda jornal, televisão, livro, CD-ROM, vídeo, grupos de debates, painéis e apresentação em seminários e congressos sobre o tema.

No ano do quinto centenário dos Descobrimentos Portugueses, o temário está sendo enfocado dentro dessa ótica, sendo intitulado “Viagens por 5 séculos” -  de Lisboa a Santos, de Santos aos Campos de Piratininga, voltando do cafezal a Santos e de Santos para a própria cidade. 

Viagens – Através de imagens antigas e atuais, algumas bastante raras, entre mapas, desenhos, pinturas e fotos, viaja-se desde as origens portuguesas quinhentistas até a cidade atual, passando pelas etapas da colonização, interiorização do processo civilizatório, retorno ao litoral paulista com o ciclo cafeeiro, sempre enfocando características arquitetônicas e urbanas, integradas aos vários usos que a cidade foi tendo ao longo do tempo. 

As diferentes visões – arquitetônica, literata, poética, fotográfica, tinturesca – são cada vez mais exploradas no trabalho, conforme avança no tempo. Assim, na primeira viagem são mostradas as influências lusas e indígenas na então Vila de Santos; na segunda viagem, é mais explorada a arquitetura urbana colonial em função da cidade como elo de ligação entre os caminhos marítimos e o interior paulista; na terceira, são mostradas as influências do ciclo cafeeiro, da arquitetura neoclássica, da ferrovia e do saneamento, do novo porto organizado e como a cidade colonial era vista por pintores, urbanistas e fotógrafos. 

A última viagem é para o íntimo da própria cidade, com seus poetas, o turismo, as novas concepções urbanísticas, a influência econômica e cultural do complexo portuário e suas transformações, culminando numa análise das alterações arquitetônicas, da influência das novas mídias e as perspectivas para o binômio porto-cidade – que, formando uma palavra só, Portocidade, denomina o projeto e simboliza a união indissolúvel entre essas duas entidades que se interpenetram e se influenciam mutuamente.

Internet  – Um exemplo das novas influências é a Internet, onde existem alguns sites sobre Santos que veiculam uma imagem particular da cidade, afirmando especialmente seu aspecto turístico. O projeto prenuncia o momento em que a cidade real começará a ser modelada pela cidade virtual, sofrendo as influências dessa visão cibernética. 

O conhecimento que teremos no futuro sobre a cidade se baseará cada vez mais nessas imagens trabalhadas em computador, da mesma forma como a fotografia produziu profundo impacto nas iconografias do século XIX, criando novos imaginários coletivos. Ao mesmo tempo, a tecnologia disponível permite o acesso a detalhes micro ou macro das imagens do passado, ampliando de forma inimaginável nosso conhecimento sobre as origens da cidade e a influência de aspectos culturais sobre sua formação.

Conforme citação incluída no site Portocidade, “Se por um lado a confiabilidade nessas imagens, pelo seu potencial de manipulação, é relativa, o processamento e a criação de simulações digitais permitem uma ampliação infinita no potencial de conhecimento que a imagem pode gerar, permitindo a reconstituição de objetos inacessíveis aos sentidos humanos tanto em nível macro como micro físico, numa relação em que mesmo a fotografia ou o cinema jamais poderiam supor.”

Perspectivas – Lembram os pesquisadores que não é possível formular uma visão de futuro sem levar em conta o passado. Ao longo da História, essa reflexão sobre o relacionamento entre porto e cidade ocorreu de formas diferentes: havia uma simbiose no período colonial (“quando os territórios não eram demarcados e os trapiches com suas pontes precárias levavam a cidade até os navios. Estabeleceram a parceria no ciclo do café que permitiu o desenvolvimento de ambos, do porto e da cidade, na mesma medida que um dependia do outro. Parceria essa que, a partir da industrialização, se transformou numa relação de dependência e conflito”). 

Rompido o equilíbrio dessa relação, vivemos agora novamente a substituição do projeto político-econômico por outro, decorrente da globalização e das mudanças nos sistemas de comunicação e portanto da competitividade com outros centros econômicos e portuários. 

“Essas transformações precisam atender ao aumento do movimento e características das cargas, sua estocagem e operação cada vez mais rápida e eficiente, gerando modificações inevitáveis nas formas de relação do trabalho. Para superar esses conflitos devemos prever o restabelecimento da parceria entre porto e cidade, aplicado às condições de legitimidade das políticas urbanas, onde o planejamento estratégico e a idéia de desenvolvimento sustentável estejam presentes”, afirmam os autores do projeto.

Para eles, embora parte considerável dos conceitos de planejamento urbano estratégico partam do âmbito empresarial, a complexidade das cidades precisa considerar outros fatores, como o peso dos movimentos sociais e a disputa entre atores sociais pela institucionalização e durabilidade de seus pressupostos políticos de modelo de cidade. 

Três modelos – O trabalho identifica e pretende aprofundar o estudo de três modelos básicos de cidade encontráveis em Santos: a cidade-empresa, a cidade energeticamente eficiente e a cidade de políticas públicas. No primeiro caso, busca-se atrair investimentos fortalecendo as vantagens competitivas em relação a outras cidades; a idéia de uma cidade energeticamente eficiente implica em cuitados ecológicos como redução do volume de rejeitos e da degradação ambiental e energética; o terceiro modelo pugna pela adaptação da oferta de serviços públicos (infra-estrutura) à quantidade e qualidade das demandas sociais.

Um projeto político comum da sociedade deverá conciliar os vários modelos, e nesse processo as universidades têm papel fundamental, “na medida que reúnem a pluralidade do pensamento ao princípio da pesquisa e da geração de conhecimento”. Outros parâmetros poderão ser as experiências de cidades norte-americanas, européias ou latino-americanas: comparadas, analisadas e adaptadas, servem como orientação para o processo de criação coletiva do futuro desse binômio porto/cidade, em termos de conciliação do desenvolvimento com a qualidade de vida.

(*) Carlos Pimentel Mendes é editor do jornal eletrônico Novo Milênio.

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