Na ponta do dedo
Mário Persona (*)
Colaborador
Nicholas
Negroponte, co-fundador do MIT Media Laboratory e autor de "Being Digital",
deu uma definição interessante para a diferença entre
um cão e um ser humano. Está no prefácio do livro
"Unleashing the Killer Apps" (www.killer-apps.com),
escrito por Larry Downes e Chunka Mui. "Quando você aponta o dedo,
o cão olha para a ponta de seu dedo. O ser humano olha na direção
para onde você está apontando".
Tem muita gente falando de Internet
ultimamente. Mas a grande maioria está falando do dedo. Está
todo mundo preocupado demais com os meios, para conseguir enxergar o fim.
Ou com formas bonitas de se enxergar o meio. Não estão olhando
para onde a rede está apontando. Todo mundo de olho na ponta desse
dedo cibernético.
É típico do novo empreendedor
ler meia dúzia de artigos em revistas, correr para uma livraria,
comprar um livro de html e começar a procurar um investidor. Viu
um portal famoso, tirou algumas conclusões, arruma aqui, acerta
ali, e lá vai o sujeito criar mais um site para inglês ver.
E para americano investir.
Tudo no início - Vi
um site que vende sites. É divertido passear por lá. Sites
de todos os tipos. Tudo girando em torno daquilo que as pessoas podem ver
na telinha. Parece até esses concursos de arte para iniciantes.
Porque, na rede, todo mundo é iniciante. Ninguém tem certeza
se é ou não artista, até que o juri decida. Não
quem já é artista, mas quem poderá ser no futuro.
O problema é que, até agora, quase nenhum candidato teve
acesso aos resultados.
Eu mesmo sou um pretenso empreendedor.
Como qualquer outro, tenho minha ocupação, que garante o
pão, e minha pretensão, que acredito ser original. Meu empreendimento?
Escrever artigos como este. Como todo pretenso empreendedor, chego a acreditar
que estou no rumo certo, pois minha mãe lê todos os meus artigos.
Ela não usa Internet, mas lê em uma revista regional. Mas,
como todo pretenso empreendedor, sofro de alguns momentos de incerteza,
se estou mesmo na rota do sucesso. Deve ser porque a revista pertence à
minha irmã.
A frustração pode também
atingir os novos empreendedores quando começam a descobrir que alguém
já tinha pensado naquilo que pensou estar inventando de primeira
mão. E o mais preocupante é que há investidores correndo
atrás de novas versões dessas velhas idéias, quando
deviam ter o rabo do olho no índice NASDAQ, que ultimamente parece
estar procurando um barranco para se apoiar.
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O livro Unleashing The Killer
App foi escrito por Larry Downes e Chunka Mui
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Dificuldades - Algumas empresas
virtuais já começam a abrir a boca para avisar que vão
abrir o bico antes do final do ano, se não receberem injeções
de capital. Mas os donos da vitamina estão ficando mais espertos
e começam a acreditar que seus parceiros ficaram viciados no bem-bom.
Até quando? Creio que até a economia, como um todo, se acomodar,
trazendo o mundo virtual para o mundo real. Como a Gameplay.com, que acaba
de excluir o ".com" de seu nome. Isto não é pessimismo. É
a evolução das coisas. O e-business que deixa de ser "e-"
para ser apenas business.
Internet é muito mais que
sonhos, divagações, sites bonitos e pretensões. E
quem já começou a olhar na direção em que o
dedo aponta, não se preocupa mais com o dedo, ou em tentar fazer
de uma home page bonitinha um negócio milionário. Ao contrário,
vai começar a pensar em inventar algo para prestar algum tipo de
serviço. Se vai ter página ou não, se vai usar este
ou aquele recurso visual, não vai importar muito. O importante será
atender necessidades. Isto pode não ser muito chique, mas é
a vocação da rede.
Previsões - As previsões
de amanhã apostam no trio "Internet, Device & Application".
A primeira para transportar, o segundo para processar, e o terceiro como
produto ou serviço adquirido na forma daquilo que uma revista chamou
de "torneira". Quantas torneiras dessas são possíveis? De
quantas o mercado necessita? Nem imagino. Mas, enquanto isso, muitas empresas
continuarão a insistir em permanecer no período de transição,
deslumbradas com a ponta do dedo do progresso. Já passou o tempo
de olhar para o dedo, para ver se ele é confiável. Agora
é hora de olhar para onde o dedo aponta. É lá que
mora o filé.
Termino citando as palavras de Michael
Dell, o jovem que revolucionou a montagem e venda de computadores. E pode
ter certeza de que ele não estava falando de home page, mas de eficiência
em processos industriais e comerciais: "Mostre-me um negócio que
não esteja na Web, ou que não esteja planejando entrar nela,
e eu lhe mostrarei um negócio sem futuro. A Internet fará
o eficiente ficar mais eficiente - e deixará o resto comendo poeira...
A Internet já faz parte da corrente de negócios."
(*) Mário
Persona é diretor de comunicação da Widesoft,
que desenvolve sistemas para facilitar a gestão da cadeia de suprimentos
via Internet. |