Clique aqui para voltar à página inicial  http://www.novomilenio.inf.br/ano00/0004a009.htm
Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 04/07/00 06:51:00
Na ponta do dedo 

Mário Persona (*)
Colaborador

Nicholas Negroponte, co-fundador do MIT Media Laboratory e autor de "Being Digital", deu uma definição interessante para a diferença entre um cão e um ser humano. Está no prefácio do livro "Unleashing the Killer Apps" (www.killer-apps.com), escrito por Larry Downes e Chunka Mui. "Quando você aponta o dedo, o cão olha para a ponta de seu dedo. O ser humano olha na direção para onde você está apontando".

Tem muita gente falando de Internet ultimamente. Mas a grande maioria está falando do dedo. Está todo mundo preocupado demais com os meios, para conseguir enxergar o fim. Ou com formas bonitas de se enxergar o meio. Não estão olhando para onde a rede está apontando. Todo mundo de olho na ponta desse dedo cibernético.

É típico do novo empreendedor ler meia dúzia de artigos em revistas, correr para uma livraria, comprar um livro de html e começar a procurar um investidor. Viu um portal famoso, tirou algumas conclusões, arruma aqui, acerta ali, e lá vai o sujeito criar mais um site para inglês ver. E para americano investir.

Tudo no início - Vi um site que vende sites. É divertido passear por lá. Sites de todos os tipos. Tudo girando em torno daquilo que as pessoas podem ver na telinha. Parece até esses concursos de arte para iniciantes. Porque, na rede, todo mundo é iniciante. Ninguém tem certeza se é ou não artista, até que o juri decida. Não quem já é artista, mas quem poderá ser no futuro. O problema é que, até agora, quase nenhum candidato teve acesso aos resultados.

Eu mesmo sou um pretenso empreendedor. Como qualquer outro, tenho minha ocupação, que garante o pão, e minha pretensão, que acredito ser original. Meu empreendimento? Escrever artigos como este. Como todo pretenso empreendedor, chego a acreditar que estou no rumo certo, pois minha mãe lê todos os meus artigos. Ela não usa Internet, mas lê em uma revista regional. Mas, como todo pretenso empreendedor, sofro de alguns momentos de incerteza, se estou mesmo na rota do sucesso. Deve ser porque a revista pertence à minha irmã.

A frustração pode também atingir os novos empreendedores quando começam a descobrir que alguém já tinha pensado naquilo que pensou estar inventando de primeira mão. E o mais preocupante é que há investidores correndo atrás de novas versões dessas velhas idéias, quando deviam ter o rabo do olho no índice NASDAQ, que ultimamente parece estar procurando um barranco para se apoiar.
 

Larry Downes
Unleashing the Killer App
Chunka Mui
O livro Unleashing The Killer App foi escrito por Larry Downes e Chunka Mui

Dificuldades - Algumas empresas virtuais já começam a abrir a boca para avisar que vão abrir o bico antes do final do ano, se não receberem injeções de capital. Mas os donos da vitamina estão ficando mais espertos e começam a acreditar que seus parceiros ficaram viciados no bem-bom. Até quando? Creio que até a economia, como um todo, se acomodar, trazendo o mundo virtual para o mundo real. Como a Gameplay.com, que acaba de excluir o ".com" de seu nome. Isto não é pessimismo. É a evolução das coisas. O e-business que deixa de ser "e-" para ser apenas business.

Internet é muito mais que sonhos, divagações, sites bonitos e pretensões. E quem já começou a olhar na direção em que o dedo aponta, não se preocupa mais com o dedo, ou em tentar fazer de uma home page bonitinha um negócio milionário. Ao contrário, vai começar a pensar em inventar algo para prestar algum tipo de serviço. Se vai ter página ou não, se vai usar este ou aquele recurso visual, não vai importar muito. O importante será atender necessidades. Isto pode não ser muito chique, mas é a vocação da rede.

Previsões - As previsões de amanhã apostam no trio "Internet, Device & Application". A primeira para transportar, o segundo para processar, e o terceiro como produto ou serviço adquirido na forma daquilo que uma revista chamou de "torneira". Quantas torneiras dessas são possíveis? De quantas o mercado necessita? Nem imagino. Mas, enquanto isso, muitas empresas continuarão a insistir em permanecer no período de transição, deslumbradas com a ponta do dedo do progresso. Já passou o tempo de olhar para o dedo, para ver se ele é confiável. Agora é hora de olhar para onde o dedo aponta. É lá que mora o filé.

Termino citando as palavras de Michael Dell, o jovem que revolucionou a montagem e venda de computadores. E pode ter certeza de que ele não estava falando de home page, mas de eficiência em processos industriais e comerciais: "Mostre-me um negócio que não esteja na Web, ou que não esteja planejando entrar nela, e eu lhe mostrarei um negócio sem futuro. A Internet fará o eficiente ficar mais eficiente - e deixará o resto comendo poeira... A Internet já faz parte da corrente de negócios."

(*) Mário Persona é diretor de comunicação da Widesoft, que desenvolve sistemas para facilitar a gestão da cadeia de suprimentos via Internet.