Negócios móveis
Mário Persona (*)
Colaborador
Dentre as
muitas leis de Murphy, deve existir uma que diz que o número de
pessoas solícitas que aparecem para empurrar um carro quebrado é
diretamente proporcional à inclinação do terreno.
Se o carro quebrar na descida, sempre vai encontrar alguém para
dar um empurrãozinho. E se você for jovem e bonita, aí
uma centena de consumidores de esteróides disputarão cada
palmo da lataria de seu fusca. Mas se for na subida, seu carro vai ter
que ficar imóvel até a chegada do guincho.
Esta lei se aplica também
à Internet, onde os primeiros negócios de sucesso foram justamente
aqueles que já estavam na descida e em ponto-morto. Bastou um empurrãozinho
tecnológico para que ninguém mais conseguisse segurar. O
exemplo clássico disto é o livro, um produto que há
anos já era vendido pelo correio. Antes mesmo de eu nascer, meu
pai já participava de um clube do livro, que fazia de cada lançamento
um meio de cativar e garantir o público para o lançamento
seguinte. Embora a rede não existisse nem em seus mais arrojados
volumes de ficção, eles sabiam que não bastava vender.
Era preciso manter um link constante com o cliente, atendendo e
excedendo suas expectativas a cada lançamento.
Mas se a tradicional venda de livros
pode ser transportada para a Internet com status de caminhão
velho em ladeira - sem calço na roda - o mesmo não se pode
dizer de outros produtos que precisam ser vistos, tocados ou experimentados
antes da compra. Mas enquanto muitos negócios desse tipo na Web
permanecem parados, outros estão ganhando velocidade. É o
que acontece com o site de venda de móveis, Furniture.com,
dirigido por Andrew Brooks. Em entrevista a http://www.strategyweek.com,
Brooks revelou que o segredo de seu sucesso foi observar as desvantagens
das compras nas lojas de móveis convencionais. Os clientes eram
geralmente casais sem tempo, que gastavam cinco ou seis finais de semana
carregando crianças choronas no colo, até conseguirem encontrar
o que procuravam.
Traçado o perfil do cliente,
suas necessidades e expectativas, a Furniture.com foi para a Web, com cinquenta
mil peças de mobília em exposição. Já
que não podia competir com as vantagens da loja convencional, Brooks
procurou concentrar-se nas desvantagens encontradas nas compras convencionais.
O cliente tinha pouco tempo? Uma loja na Internet, funcionando 24 horas
por dia, seria ideal para se fazer compras até de madrugada. O cliente
reclamava de precisar percorrer uma grande loja até encontrar o
que queria? A Furniture.com ofereceria um sistema de busca rápida,
por tipo de móvel, cômodo ou detalhes como o tipo de madeira
ou tecido de revestimento.
Ao invés usar toda a tecnologia
que existe para sites de Internet, Brooks procurou primeiro entender quais
as necessidades de seus consumidores, e depois saiu à procura da
tecnologia que resolvesse o problema. Oferecendo descontos em compras futuras,
ou o uso de funcionalidades exclusivas como o sistema para projetar a decoração
dos cômodos, a empresa consegue convencer seus visitantes a se cadastrarem
no site. Isso cria o link da empresa com o visitante, que acaba
virando um relacionamento de longo prazo.
Se desapontar... - Não
importa se você vende livros ou móveis. Se você desapontar
o cliente, sua empresa acabará imóvel como um caminhão
quebrado na subida, sem ninguém para empurrar. Se tiver que se mover,
será para trás, e aí ninguém segura.
Foi o desapontamento que levou meu
pai a abandonar o clube do livro do qual era cliente na década de
cinquenta. Na ânsia de publicar qualquer autor que lhe caísse
nas mãos, a empresa acabou lançando um grosso volume de suspense,
desses de fazer inveja a Hitchcock. Na ânsia de descobrir quem era
o assassino, meu pai passou uma noite em claro, devorando as últimas
páginas do livro. Perto do desfecho, ao virar a última página
com a adrenalina ao máximo, encontrou uma "Nota dos Editores" que
dizia: "Lamentamos informar que esta obra permaneceu inacabada em virtude
da morte do autor". .
(*) Mário
Persona é diretor de comunicação da Widesoft,
que desenvolve sistemas para facilitar a gestão da cadeia de suprimentos
via Internet. |