Foto: Luiz Torres/DL, publicada com a matéria
CIDADES
É preciso criar uma faixa de proteção na orla, diz geóloga
Doutora em Geologia Sedimentar e pesquisadora do Instituto Geológico da Secretaria de Meio
Ambiente do Estado, Célia Gouveia afirma que é preciso aumentar 50 metros de areia para minimizar os impactos na zona costeira em função das
mudanças climáticas
Da Reportagem
Se o Litoral Paulista e, em especial, a Baixada Santista não
promover intervenções significativas em toda a sua orla, como por exemplo, o aumento de, no mínimo, 50 metros da extensão da areia, a natureza vai
fazer o serviço, causando impactos danosos em todos os empreendimentos construídos ao longo das últimas décadas, como os jardins da praia e
edifícios de Santos.
Esse foi um dos muitos pontos abordados ontem, pela pesquisadora científica do Instituto Geológico
da Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São Paulo, a geóloga Célia Regina Gouveia, durante palestra proferida na última reunião do Conselho
Municipal de Defesa do Meio Ambiente (Comdema) de Santos, na Universidade Santa Cecília (Unisanta).
Doutora em Geologia Sedimentar e professora da Universidade de São Paulo (USP), Célia Regina
apresentou um estudo de como as mudanças climáticas e a elevação do nível do mar estão impactando a zona costeira, que vem sofrendo com um número
excessivo de ressacas e erosões.
"A ponta da praia, em Santos, principalmente
no trecho entre o Aquário e o Ferry Boat, é um exemplo desses impactos, que começaram há muito tempo. As mudanças climáticas já estão ocorrendo.
Todos nós já estamos percebendo o aumento da temperatura do ar, da água e a elevação gradativa do nível do mar",
disse a geóloga.
Durante cerca de duas horas, Célia Regina falou não só da erosão costeira, mas das mudanças
marinhas, do aumento da entrada do mar no continente (intrusão da cunha salina), elevação do lençol freático e outros impactos.
"Em 2010, as ressacas foram da metade de
fevereiro até a metade de dezembro. Em outros tempos, o período se limitava de abril a agosto. As ressacas não permitem que a praia se recupere e as
praias de Santos vêm diminuindo nos últimos 50 anos".
Segundo a geóloga, todo esse movimento natural e, principalmente, a elevação do nível do mar, que
vem aumentando ano a ano, pode trazer prejuízos à área urbanizada como, por exemplo, os decks da ponta da praia, o Aquário e até os prédios.
"Há prognósticos de que até 2100 o nível do
mar subirá dois metros, que é justamente a linha dos prédios da orla. Precisamos reestudar intervenções nos bloqueios que impedem o fluxo natural do
mar. Basta dizer que a Ponta da Praia vem recuando lateralmente em direção ao Canal 6. A Praia do Gonzaguinha, em São Vicente, é responsável pela
maior taxa de recuo do Estado de São Paulo e acredito que ela irá sumir em menos de 100 anos",
disse.
Entre os muitos bloqueios estão o emissário submarino, os prédios "pé na areia",
localizados entre o Canal 1 (Santos) e a Divisa com São Vicente, a passagem para a Ilha Porchat (que prejudicou o fluxo e foi fundamental para a
situação do Gonzaguinha) e dezenas de outros.
"Estamos num processo geológico em que a
temperatura vem subindo e o nível do mar também, principalmente nos últimos anos. Em Cananéia, a taxa de elevação já chegou em 40 centímetros – o
dobro da taxa mundial. Nas próximas décadas, haverá partes do planeta [em]
que a taxa subirá até dois metros e outras mais de dois metros", afirma, alertando que não
existem, ainda, projeções para a região.
O que fazer – A geóloga afirma que o poder público e a sociedade organizada precisam
iniciar estudos e tomar medidas baseadas nesta realidade, como a criação de uma legislação específica para preservar as praias, que limite e
regularize obras costeiras.
"Um anteparo de pedra é construído para
proteger a avenida, mas piora a erosão. É preciso parar de se construir na areia da praia e criar uma faixa de proteção de no mínimo 50 metros de
largura. Na Espanha, a zona de proteção é de 100 metros. Não existe praia hoje que não esteja sob risco".
Célia Regina afirma que os maiores impactos que serão causados em função da erosão costeira, do
excesso de ressacas, da elevação do lençol freático e do nível do mar serão: a destruição de imóveis da orla; problemas nas atividades portuárias;
comprometimento da paisagem; inundações; redução do estoque pesqueiro; além de problemas na rede de esgoto e no fornecimento de água, entre tantos
outros. |