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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS
Famosos relógios públicos da cidade (III-B)

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Quem hoje tem a hora exata a um toque no telefone celular e vive cercado de meios de obter essa informação mal imagina como, em tempos idos, uma torre com relógio, os sinos de uma igreja dobrando nas chamadas horas canônicas, a sirene apitando para chamar os trabalhadores, tinham significação extraordinária para a população de uma cidade que mal contava com sistemas de telefonia razoáveis.

Um dos mais famosos relógios públicos de Santos foi o da Western Telegraph. Foram muitas as tentativas para recuperá-lo, bem como os projetos apresentados, como registrou o jornal santista A Tribuna, em matéria de 4 de junho de 1992, página 8:

A Codesp desenhou um projeto de torre para abrigar o relógio

Imagem publicada com a matéria

PORTO & MAR

Codesp repara relógio de valor histórico

A Codesp está recuperando o histórico relógio de torre da Western Telegraph & Co., que funcionou durante quase seis décadas. A montagem e recuperação começaram no dia 20 de março deste ano. Em um ou dois meses, será feito um teste do mecanismo

Armando Akio

Editor

As informações são de Antônio Roberto Almeida Coutinho, supervisor de Oficinas, que comanda uma equipe de 120 homens, responsáveis pelo quebra-cabeças que é remontar o relógio.

São bastante escassos os dados históricos a respeito do relógio. A Tribuna, na edição de 30 de janeiro de 1973, cita que ele começou a funcionar em 1914 e foi desativado em 25 de abril de 1973, cita que ele começou a funcionar em 1914 e foi desativado em 25 de abril de 1973, ao meio-dia. Dois meses antes, a companhia britânica de telégrafos anunciara que encerraria as atividades em todo o Brasil.

Docas de Santos – Julio Marcus Vilella Blanco, da Comissão de Eventos Especiais da Codesp, 51 anos, 32 de porto, diz que o prédio da Western foi comprado (com o relógio incluído) pela Companhia Docas de Santos (CDS), concessionária particular.

Era necessário ampliar a faixa portuária. O progresso, mais uma vez, apagou registros da história. Os trabalhadores do porto e os cidadãos santistas, de modo geral, acertavam a hora pelo relógio da Western.

Ele estava cronometrado pelo tempo da British Broadcastig Company (BBC), de Londres, Inglaterra, e recebia informação auxiliar da Rádio-Relógio Federal do Rio de Janeiro.

Aquisição – A compra do prédio da Western pela CDS foi efetivada no dia 8 de agosto de 1973, segundo documento em poder da Codesp. O edifício tinha o pavimento térreo e três andares superiores, além da torre.

O contrato de aquisição diz que o relógio tem quatro faces e diâmetro de 2,40 metros. O endereço era Largo Senador Vergueiro, nº 1/2, na esquina da Rua Frei Gaspar com o cais em frente aos armazéns 2 e 3.

A fábrica foi a Gillet & Johnston, da cidade de Groydon, Inglaterra, e o nº de produção, 9.070. No coração do relógio, está escrito que ele tem garantia do rei George V, que nasceu em 1865, foi coroado em 1892 e morreu em 1936.

Sem resposta – Julio Blanco diz que a Codesp, alguns anos atrás, chegou a escrever para a fábrica, na Inglaterra, solicitando dados sobre o relógio, mas não obteve resposta. Blanco não se recorda com precisão do ano em que a empresa enviou o pedido de informações.

O cabo para dar corda no relógio tem 28 metros de extensão, segundo dados da Supervisão de Oficinas da Codesp. O material básico são o bronze e o ferro fundido. Quando desativado, ele foi colocado em 22 caixas, com um peso total de 2.522 quilos. Quando a remontagem começou, as cenas foram registradas em vídeo, para criar uma memória sobre ele, conta Julio Blanco, da Comissão Especial de Eventos da Codesp.

Para o teste de funcionamento, a Codesp instalará um andaime especial de quatro metros de altura. Para isso, não será necessária uma torre como a do prédio da Western, pois o diâmetro do relógio é de 2,40 metros.

O artífice Carmelo Sousa Santana instala o ponteiro de 1,5 metro

Foto Reinaldo Ferrigno, publicada com a matéria

Paulistano fez consertos

O relojoeiro Augusto Fiorelli, 80 anos, desde os 15 em atividade, chegou a fazer alguns reparos no relógio da Western, apesar de ser estabelecido em São Paulo. Ele se lembra de que o relógio é do tipo mecânico, mas não se recorda se tinha um ou dois pesos.

Se ele era bipeso, tinha um peso para a corda e outro para anunciar a hora, de 60 em 60 minutos. Se dispunha de apenas um peso, este servia apenas para dar a corda, Fiorelli atesta a qualidade do relógio, mas não recorda detalhes. O relojoeiro nega que ele fosse semelhante ao Big Bem, de Londres – existe um similar em Paranapiacaba, cidade que tem a reprodução de uma estação de trem inglesa.

Fiorelli é o relojoeiro do Mosteiro de São Bento e tem loja na Rua Benjamin Constant, 80, sala 62, na região da Praça da Sé, em São Paulo.

O relógio da Western tem garantia do rei George V, da Inglaterra

Foto Reinaldo Ferrigno, publicada com a matéria

Projeto custará Cr$ 25 mi

Construir uma torre de 27 metros de altura, ao custo de Cr$ 25 milhões a preços de maio, para abrigar o relógio. O empreendimento está aberto à participação da iniciativa privada. Este é um dos sonhos da Codesp, revela Julio Blanco, da Comissão Especial de Eventos. Ele diz, porém, que o assunto não é prioritário, porque a empresa precisa investir primordialmente no porto.

Blanco ressalva que o custo de Cr$ 25 milhões seria para uma torre simples, de concreto, sem nada de excepcional. Lembra ele que outros projetos, mais ambiciosos, foram colocados no papel, como uma torre de 35 metros, nos anos de 83 e 84.

A Codesp tem pedras que poderiam ornamentar a torre, como as antigas construções, observa Blanco. Mas o problema esbarra no elevado custo dos artesãos para trabalharem o material. A lapidação é uma verdadeira obra de arte, comenta Blanco, acrescentando que os profissionais desse ofício, os canteiros, são raríssimos – tanto quanto o relógio.

Quatro no mundo – Julio Blanco ouviu de um relojoeiro antigo a informação de que o relógio da Western seria um dos quatro existentes no mundo inteiro. O da Estação Dom Pedro II, no Rio de Janeiro, é idêntico. Outro relógio igual existiria em Londres e o quarto em algum país da Europa.

Blanco tem sonhos fantásticos para a torre que poderia abrigar o relógio da Western. Ele acredita que o empreendimento deveria ser de alto nível, atraindo turistas nacionais e estrangeiros. Um restaurante de classe internacional e um mirante não estariam descartados, para complementarem o projeto.

O membro da Comissão Especial de Eventos acredita que somente grupos econômicos fortíssimos teriam condições de suportar um investimento de tal porte. Ele crê que basicamente os setores de cigarro e bebida estariam à altura do projeto.

Carmelo e Orlando Monteiro consertam o coração do aparelho

Foto Reinaldo Ferrigno, publicada com a matéria

Cassino – Outra possibilidade seria a liberação do jogo no Brasil, segundo Blanco. Ele argumenta que algum empresário do setor de entretenimento (ou de qualquer outra área) poderia bancar a construção da torre, que abrigaria, além do histórico relógio, um cassino – uma atração turística nacional e até em nível mundial.

Deixando de flutuar nas nuvens e colocando os pés muito bem firmes no chão, Julio Blanco aponta a chance de o projeto da torre ser financiado por passeios de barco pelo estuário para turistas. As viagens gerariam uma fonte de recursos para a Codesp.

A torre ainda teria espaço para uma biblioteca específica de porto, conteria parte da documentação histórica do cais e teria outras atrações de interesse público.

Até 65 metros – A altura da torre, por mais mirabolante que seja o projeto, não poderá superar 65 metros. Esta é a altura dos silos verticais que armazenam trigo e outros grãos, no porto.

O Ministério da Aeronáutica, que controla o tráfego aéreo, não permitirá uma construção superior a 65 metros, na área do porto.

Rodas do equipamento têm cerca de 2,5 metros de diâmetro

Foto Reinaldo Ferrigno, publicada com a matéria

Um resgate da memória

O conserto do relógio da Western é o resgate da memória de Santos, é um religamento com o passado, segundo a professora de História, Wilma Therezinha de Andrade, da UniSantos, doutorada na disciplina pela USP.

Ela recorda que a hora da torre da companhia britânica de telégrafos era considerada como a certa, pelos santistas. As pessoas acertavam seus relógios de pulso ou de bolso pelo da Western.

Wilma diz que é muito importante recuperar a tecnologia histórica do relógio da Western e colocá-lo à disposição do público. "Considero a idéia da torre uma ótima idéia, porque o relógio é um dos símbolos contemporâneos, tanto que a USP criou um Centro de Estudos do Tempo para pesquisar tudo sobre o tempo".

Em consulta a alguns livros sobre o passado de Santos, Wilma encontrou no Dicionário de Curiosidades, do jornalista Olao Rodrigues, algumas breves referências ao relógio da Western, considerado bastante popular e de pontualidade britânica.

Uma das pioneiras – Sobre a Western, Wilma descobriu que a empresa se instalara em 1873 em Santos, bem como em outros centros urbanos do País. A Cidade foi uma das primeiras do Brasil a receber as atividades da companhia britânica.

Clóvis Bandeira Brasil, nomeado interventor no  Município de Santos, interessou-se pelo relógio da Western, em 1973, quando ela encerrou as atividades no Pais, mas não houve avanços no intento.

Wilma: recuperando o passado

Foto: Irandy Ribas/Arquivo, publicada com a matéria

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