BICO-DE-PENA
Desenhos de Francisco Carballa [104]
O professor Francisco Carballa registrou no papel, com lápis e caneta esferográfica, imagens de uma cidade que aos poucos foi desaparecendo, com ênfase nos detalhes
arquitetônicos, característicos de um encontro de culturas que se manifestou na primeira metade do século XX.
São edificações de uso comum, comerciais e residenciais, muitas delas demolidas, raramente preservadas, e que nesses detalhes captados pelo professor revelam aspectos curiosos de uma
época já desaparecida. Quando existente, a linha do bonde é registrada nos desenhos, e uma marca registrada desses trabalhos costuma ser a existência de um vidro quebrado numa janela, sempre da mesma forma:
Rua Braz Cubas, 254 - "Construção pesadona que após o incêndio de 2012 foi demolida em agosto daquele ano, mesmo tendo uma estrutura resistente. Seu porão foi uma oficina de bicicletas e de último era
um bazar de pechinchas. Além de servir como aluguel de cômodos, a casa abrigou uma família única na parte superior, que mantinha vasos com plantas espada-de-são-jorge, por crença religiosa" (6/3/2013)
Imagem cedida a Novo Milênio pelo autor, o professor Francisco Carballa
O local em março de 2011, visto pelas câmeras do programa Street View (acesso em 28/8/2012)
Notícia do incêndio, no jornal santista A Tribuna, em 8 de agosto de 2012, pág. A-6:
Cinco viaturas dos Bombeiros logo chegaram para enfrentar as chamas
Foto: Vanessa Rodrigues, publicada com a matéria
Grande incêndio destrói cortiço na Rua Braz Cubas
Da Redação
Um incêndio de grandes proporções destruiu um cortiço onde moravam 16 famílias e deixou 50 pessoas desabrigadas - mas sem vítimas. A casa
de dois andares fica na Rua Braz Cubas, nº 254, no Centro de Santos. As chamas começaram por volta das 18h30 de ontem. Cinco viaturas do Corpo de Bombeiros estiveram no local.
O proprietário de um comércio de motocicletas que fica ao lado do cortiço, Kleber Santos Silva, de 23 anos conta que estava no estabelecimento quando o fogo começou.
"As famílias do cortiço correram para fora. Eles estavam muito assustados, choravam. Perderam tudo", conta. Kleber afirma que o fogo não chegou a atingir o comércio, mas queimou parcialmente um
carrinho de pastel, que ficava próximo ao local.
Segundo o chefe da Defesa Civil de Santos, Daniel Onias, as chamas destruíram 50% do piso da casa e parte do telhado. A bicicletaria localizada no térreo não foi comprometida.
"A residência está isolada para evitar acidentes, em caso de queda da estrutura. Amanhã (hoje) realizaremos uma vistoria mais detalhada para avaliar as condições do imóvel".
Os moradores foram impedidos de entrar na casa para tentar retirar pertences. "Por segurança, a Guarda Municipal passará a noite no local, para garantir que ninguém tente invadi-lo".
Em decorrência do incêndio, a Rua Braz Cubas precisou ser interditada durante o combate às chamas. E a calçada em frente ao cortiço ficará bloqueada.
A equipe de Assistência Social do município auxiliou os desabrigados. Alguns preferiram se deslocar para a casa de parentes e amigos, outros foram encaminhados para abrigos da Cidade.
Nada sobrou para as dezesseis famílias que moravam no cortiço
Foto: Vanessa Rodrigues, publicada com a matéria |
O mesmo jornal A Tribuna noticiou, em 9 de agosto de 2012, pág. A-7:
Defesa Civil interditou o imóvel no número 254 da Rua Braz Cubas, onde houve o acidente. O local não oferece mais condições para habitação
Foto: Nirley Sena, publicada com a matéria
Depois do incêndio, juntar o que restou
Os 50 moradores do cortiço que pegou fogo buscam agora novos caminhos
Tatiane Calixto
Da Redação
Após o incêndio que atingiu o número 254 da Rua Braz Cubas, em Santos, na terça-feira, a Defesa Civil interditou o imóvel, que não oferece
condições para habitação. O dia depois do incidente evidencia a insalubridade que às vezes fica escondida atrás das fachadas dos casarões da área central.
Cinquenta pessoas, que moravam no imóvel, entre elas 18 crianças e adolescentes, perderam literalmente o chão e também o teto, consumidos pelo fogo, de origem ainda desconhecida. De acordo com o coordenador técnico da Defesa Civil, Ernesto Tabuchi,
o telhado e o assoalho (principalmente no primeiro pavimento) ficaram completamente comprometidos.
Na manhã de ontem, a Defesa Civil acompanhava as famílias que recolhiam seus pertences no local, ou pelo menos o que restou deles. Os objetos salvos, mesmo que encharcados pela água que apagou o incêndio, eram amontoados em um corredor.
O cheiro de fumaça, misturado ao odor de umidade, característico dos cortiços – principalmente nos porões sem janela –, tornava a tarefa das famílias ainda mais difícil, considerando que era somado à dor de perder o pouco que tinham e ao risco de
desabamento.
"A gente fica meio deprimido. Já não tem nada e ainda perde... é complicado", diz, quase em um suspiro, José Cleberson Souza. Enquanto isso, sua companheira, Ana Maria Basto da Silva, revirava o cômodo minúsculo que antes, por R$ 300,00 mensais,
era sua casa. "Já avisei no emprego que não iria trabalhar hoje (ontem)", conta com o rosto abatido, procurando documentos em uma bolsa e guardando uma vaquinha de porcelana, quem sabe na esperança de colocá-la em um novo lar. Quando conseguir.
Ana Maria junta os pertences com esperança de colocar em um novo lar
Foto: Nirley Sena, publicada com a matéria
Segundo a Prefeitura de Santos, "a maioria dos desabrigados foi para a casa de parentes e amigos; apenas quatro pessoas estão no albergue
noturno".
Porém, os números podem se modificar. Roberta Delfino dos Santos, que passou a noite em um casarão em frente, de favor, não sabia o que fazer ontem de manhã. "Eu estava dormindo e acordei com um estrondo e vi tudo pegando fogo. Dormi de favor, mas
vou procurar falar com a Prefeitura, saber onde posso ficar", diz.
Em nota, a Administração informa ainda que assistentes sociais passaram a manhã fazendo um levantamento das necessidades das vítimas do incêndio. "As famílias já receberam cestas básicas e o Fundo Social vai ajudar fornecendo roupas, fraldas e
material de higiene".
Moradores perderam literalmente o chão e o teto, consumidos pelo fogo
Foto: Nirley Sena, publicada com a matéria
Recomeço - Ilza Isabel da Silva também estava no local. No escuro, tentava ajeitar seus pertences e suas emoções. "Estou sem ação",
confessa.
Ela e os filhos saíram de São Paulo quando o patrão do marido não cumpriu a promessa de garantir, além do salário, moradia para a família. "Passamos por São Vicente e depois viemos para cá; mas o importante é que estamos todos vivos", afirma
tentando antes se convencer, do que explicar.
O sonho de ter um lar de verdade enche os olhos de Ilza de lágrimas. Ela faz parte do mutirão, organizado pela Associação dos Cortiços, que ergue unidades habitacionais com as mãos dos próprios moradores. "Eu estou lá, perseverando. Morar aqui é
muito ruim, apesar que agora nem isso eu tenho. Mas eu não vou desistir. Um dia, vou ter uma casa decente, que eu possa deixar para os meus filhos quando não estiver mais aqui".
Ilza estava lá na hora do incêndio: "Importante é que estamos vivos"
Foto: Nirley Sena, publicada com a matéria |
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