QUEM FOI REI... nunca perde a majestade. É o caso de Waldemar Esteves da Cunha, que foi rei Momo de Santos durante mais de quatro décadas e personificou Dona Dorotéia
Foto: Leandro Amaral, publicada com a matéria
FELIZ IDADE
Eterna majestade
Nara de Paula
Se existe alguém que mais simbolize o Carnaval santista, desde os primórdios do Dona Dorotéia: vamos furar aquela onda, quando os desfiles eram
feitos em carroças puxadas por cavalos pela orla, até as atuais bandas carnavalescas, este alguém se chama Waldemar Esteves da Cunha.
Apaixonado pelo Carnaval, Waldemar começou a foliar aos 13 anos, saindo em blocos carnavalescos com os amigos do bairro onde mora há 84 anos, o Campo Grande.
A partir daí, passou a desfilar todos os anos no Dona Dorotéia, na época em que os foliões, ao final do desfile, vestidos com fantasias de papel, saltavam ao mar de um
trampolim, em frente ao Clube Saldanha da Gama, daí o lema do festejo "vamos furar aquela onda".
Ele era sempre o intérprete da matrona da festa, isto é, a própria Dorotéia, que casava sua filha com um cidadão, representados por outros dois foliões. No entanto, Waldemar só entrou
para a história do Carnaval de Santos em 1950, aos 30 anos, quando, por meio de um concurso realizado pelo extinto jornal O Diário, ele foi escolhido rei Momo da cidade, tendo em vista a sua já reconhecida dedicação a esta época do ano.
Após dois anos de reinado, a Prefeitura resolveu oficializar o Carnaval na cidade, permanecendo, então, como rei Momo oficial de Santos. Waldemar teve de deixar de "ser" Dona Dorotéia
para dedicar-se totalmente à sua corte e aos eventos que lhe tomavam as noites, de dezembro até o fim do Carnaval.
Mas nem só de folia vive um cidadão. E aí entra o protético dentário Waldemar Esteves da Cunha, que seguiu esta profissão já tradicional na sua família. Ainda novo, ele aprendeu o ofício
com o pai, ajudando-o com as formas de gesso. Foram 60 anos na carreira, sem parar um só dia, mesmo durante o Carnaval. Ele conta que, mesmo chegando em casa de madrugada, nunca faltou com suas responsabilidades profissionais.
Aos 85 anos, Waldemar Cunha relembra os tempos...
Foto: Leandro Amaralo, publicada com a matéria
O Golpe de Estado - Em 1957, houve a derrubada. Guardando mágoas até hoje, Waldemar lembra que no
Carnaval deste ano ele sofreu um golpe de Estado e foi deposto, sendo coroado, em seu lugar, um rei oriundo do Rio de Janeiro. Mas, ainda assim, ele reinou nas ruas como rei Nero, ao lado de seus leais súditos, entre lordes e ladies, apoiado
pelos cronistas carnavalescos que o levaram ao trono novamente em 58, diante da renúncia do então rei Eduardo Weisel.
Seu reinado seguiu até 1991, quando passou a coroa para Dráuzio da Cruz. No entanto, na virada do milênio, de 2000 para 2001, a pedido do então prefeito Beto Mansur, Waldemar retornou à
corte da folia. Este foi o último carnaval de seu reinado, considerado o mais longo do país.
Foi uma vida dedicada ao Carnaval e que, ainda hoje, não se desvincula facilmente. Este ano, Waldemar passará os dias de folia em Peruíbe, com família, mas uma coisa é certa: não perderá
de maneira alguma os desfiles de Escolas de Samba do Rio de Janeiro e de São Paulo.
...em que personificava Dona Dorotéia...
Foto: arquivo pessoal de Waldemar Esteves da Cunha, publicada com a matéria
Quem é rei... - Aposentado da folia, Waldemar, em seus 85 anos, não perde a cadência, e manda um recado para os atuais reis Momo. "Precisa gostar muito e ter muita vontade para
assumir esta responsabilidade. Um rei Momo não deve ficar sentado no trono, tem que ter muito balanço e amor pelo que faz, para levar, sempre com um sorriso no rosto, alegria a todos os foliões".
...e as mais de quatro décadas de reinado de Momo
Foto: arquivo pessoal de Waldemar Esteves da Cunha, publicada com a matéria
O dono do carnaval, desde o tempo dos deuses
Momo, na mitologia grega, é o filho do Sono e da Noite, o deus da zombaria, do sarcasmo, do delírio e da irreverência. Diante do seu costume de criticar e ridicularizar os outros deuses,
a divindade maior do Olimpo, após perder a paciência, o despachou para a Terra, onde o divino deportado passou a ser representado por um jovem tirando a máscara e mostrando o rosto zombeteiro, ao mesmo tempo em que sacudia guizos e apresentava o
estandarte da folia, que era a razão de sua existência.
A figura de Momo no carnaval brasileiro surgiu em 1933, no Rio de Janeiro, graças a um cronista esportivo do jornal A Noite, que apresentou aos carnavalescos um boneco feito em
papelão e sugeriu sua indicação como comandante da folia. Esse boneco desfilou no centro da cidade, sendo depois colocado em seu trono para presidir, de forma simbólica, nas comemorações daquele ano.
Mas, como os proprietários do jornal não se contentaram com o resultado conseguido, foi então iniciada uma campanha para escolher um rei de carne e osso. Estava criada, assim, a figura
do rei Momo, primeiro e único. O concurso para a escolha do rei Momo, no Rio de Janeiro, tornou-se oficial em 1950, e desde essa época sua realização corresponde a um verdadeiro espetáculo popular. |