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Movimento Nacional em Defesa
da Língua Portuguesa

NOSSO IDIOMA
Língua estranha x Língua presa

Mostrando sensível mudança de opinião sobre o assunto, o jornal Folha de São Paulo publicou em 11/8/2000 um editorial com o título Língua presa, condenando o projeto de lei em defesa do idioma - bem diferente de outro editorial que o mesmo diário publicou apenas sete meses antes, em 10/1/2000, com o título Língua estranha. Confrontamos os dois, para que os leitores tirem suas conclusões sobre a firmeza de opiniões do matutino paulista, dispensando-se mais comentários...

Editorial de 10/1/2000:
Autor:
Editoria: OPINIÃO Página: 1-2
Edição: São Paulo Jan 10, 2000
Seção: EDITORIAL

Língua estranha

A língua portuguesa não vem sendo bem tratada no Brasil. Estrangeirismos, anglicismos em especial, penetram com facilidade no idioma, a despeito de existirem correlatos na língua nacional. Preocupado em defender a identidade do português brasílico - patrimônio cultural brasileiro, segundo a Constituição -, o deputado federal Aldo Rebelo (PC do B-SP) submeteu à Câmara um projeto de lei que estabelece o uso compulsório do português e a substituição, também obrigatória, dos termos em língua estrangeira, à exceção dos consagrados pelo uso e estabelecidos pela Academia Brasileira de Letras.

Pelo projeto de Rebelo, o uso de palavras em língua estrangeira, afora as exceções previstas, "será considerado lesivo ao patrimônio cultural brasileiro, punível na forma da lei".

Nem se discuta se são factíveis os objetivos do projeto. Quantos fiscais, e com que nível de instrução, seriam necessários para zelar pela lei? De resto, vale lembrar que o intercâmbio cultural é um progresso civilizatório. A questão central é saber se o descaso com a língua e a adoção à larga de estrangeirismos se dão em conseqüência da desproteção legal ao idioma.

Na verdade, falta cultivo local do idioma. Nas escolas, pouco se difundem os escritores da língua; o idioma é ensinado de forma burocrática, não é vivenciado com apego; lê-se pouquíssimo; o acesso aos livros é difícil e caro à maioria da população, cerca de 30% funcionalmente analfabeta.

De resto, a cultura e hábitos nacionais são desvalorizados pois uma certa classe média acredita que a identidade com sua congênere norte-americana é sinal de distinção social. A subserviência colonizada, e não o diálogo cultural, determina a adoção, sem mais, de termos estrangeiros em vitrines de lojas ou de hábitos como festas de "Halloween".

O português será menos pisoteado no Brasil se seus praticantes forem mais bem cultivados, se vierem a se dar conta de que a língua, mais que mera forma de comunicação, é um meio de conhecimento.

Editorial de 11/8/2000:

Língua Presa

É assaz reprochável, para dizer o mínimo, a horda de neologismos que tomou de assalto a língua portuguesa. Não se pode mais nem mesmo ir a um shopping center sem encontrar "sales" e "offs" no lugar de liquidações e descontos. Não se toma mais um cafezinho, mas se faz um "coffee break".

Pior ainda é quando alguém se vê obrigado a "ressetar" o seu computador, por conta de um "bug" no "software", e não consegue "forwardar" um "e-mail" urgente nem acessar o seu "personal banking".

Qualquer um que aprecie um bom autor de língua portuguesa tem ganas de deletar essas expressões do idioma. O pior caminho para fazê-lo é o projeto do deputado Aldo Rebelo (PC do B-SP), aprovado anteontem pela Comissão de Educação da Câmara, que poderá estabelecer multas para quem empregar "palavra ou expressão estrangeira" que tenha equivalente em língua portuguesa.

A proposta é digna de figurar numa comédia surrealista. Pelo artigo 3º, é obrigatório o uso da língua portuguesa por brasileiros, natos e naturalizados, e estrangeiros residentes no país há mais de um ano.

Para ser conseqüente com o projeto, far-se-ia necessária a criação de brigadas lingüísticas, encarregadas de dar fiel cumprimento aos dispositivos legais. Os mui diligentes fiscais do Lácio, munidos de sólida formação filológica, resgatariam o idioma de Camões das trevas imperialistas que o ameaçam. À imortal ABL, agora dispondo de poder discricionário, caberia definir o "Volksgeist" e dar-lhe expressão vernacular.

O português já experimentou outras invasões, notadamente a dos galicismos, e sobreviveu. Na verdade, saiu enriquecido, como às vezes ocorre quando culturas se encontram. Aliás, se não houvesse essa dinâmica de influências, o português nem existiria. O idioma pátrio ainda seria o proto-indo-europeu.

Ainda não inventaram uma forma de fazer as pessoas terem bom gosto por força de lei. Diante do óbvio, faria melhor o Congresso se direcionasse seus esforços para fins mais úteis, como elevar o nível do ensino ministrado nas escolas.