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Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 01/16/03 21:18:56
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NOTÍCIAS 2003

Culturodiversidade em RH

Eduardo Wyllie (*)
Colaborador

Philip Kotler, um dos pais da mercadologia vivos e ativos, na virada do milênio deu uma boa mexida nos compostos do mix de mercadologia (fatores básicos a serem considerados no planejamento, desenvolvimento e revisão de todo trabalho de mercadologia). Acrescentou aos já tradicionais 4Ps (preço, praça, promoção e produto) outros tópicos, dentre os quais destaco a construção e preservação de uma imagem de ecologicamente correto à instituição e aos produtos.

Esta nova contribuição de Kotler, muito útil e correta, não passa, entretanto, de uma devida teorização de preocupações que vêm crescendo e de ações que já vêm sendo tomadas por grande parte das instituições públicas e privadas há pelo menos uma década.

Adoro mercadologia; considero que, se bem feita, representa o casamento de interesses de clientes, produtores e atravessadores. Porém, creio que, no que diz respeito às preocupações ecológicas, a esmagadora maioria dos gerentes está muito longe de ter atingido o âmago da questão, mesmo quando adotando uma série de práticas ecologicamente corretas. Por isso, não tendo compreendido o espírito da coisa, se limitam a aplicar o conceito estritamente no que diz respeito à preservação/recuperação da natureza.

Não que seja pouco, não que seja ruim, mas se acreditamos em bons resultados para a natureza a partir do uso do conceito do ecologicamente correto, que tal aplicá-lo sobre seus recursos humanos para obter benefícios para sua empresa? Atente e dê um passo além!

As questões ecológicas de maior urgência são a preservação dos ecosistemas e de espécies ameaçadas. O maior tesouro ecológico que pode haver é a biodiversidade. Tanto a preservação quanto a biodiversidade apontam na direção da continuidade da vida e de sua contribuição para a manutenção da saúde de um sistema maior, no qual a espécie ou o ecossistema  esteja inserido.

Para fazermos a transferência, temos de tecer algumas considerações, afinal, numa instituição não estamos trabalhando com plantas, insetos e animais, estamos trabalhando com seres humanos. Se me permitem acrescentar um ponto, na verdade, apesar de trabalharmos com seres humanos, o que esperamos e trabalhamos neles é seu raciocínio, sua lógica, suas decisões e atitudes, e sabemos que tudo isto é função da cultura da qual cada um é portador.

Agora estabeleçamos as seguintes relações:

1) Espécies ameaçadas são aquelas que correm risco de serem extintas; numa instituição, seu equivalente é aquele tipo de cultura diferente de um padrão considerado "cultura da empresa".

2) Biodiversidade é a convivência sustentada de um grande número de espécies; em instituições, biodiversidade é uma profusão de culturas que se harmonizam e assim sustentam a continuidade da prestação do papel ao qual a instituição se presta (sua missão).

Aposto que desde seu primeiro emprego, você sempre se deparou com departamentos de recursos humanos que buscam contratar pessoas "com o perfil da empresa". Perfil não é nada além dos sinais externos de se pertencer a uma determinada cultura. E contratar exclusivamente pessoas com um determinado perfil é como ter uma monocultura de raciocínios, lógicas, decisões e atitudes.

O chairman desta instituição se sentirá muito confortável ao escutar o eco de seu discurso na boca e na mente de todos seus subordinados, mas de que isto serve, além de eliminar as conseqüências desagradáveis de se deparar com novos conceitos a cada momento? No campo, o balanço de benefícios e riscos da monocultura já teria pendido há dezenas de milhares de anos para o lado do esgotamento do solo, se não fosse possível fazer rotação de culturas.

Pois numa instituição não é possível fazer rotação de "culturas", e não podemos deixar de notar que assim como as plantas se desenvolvem sobre o solo, as instituições se estabelecem sobre o mercado consumidor e de trabalho, que também se esgotam se forem explorados intensivamente da mesma forma por um longo decurso de tempo.

Podemos então avaliar a gravidade do erro que os representantes das instituições têm cometido. Só um mercado muito forte ou grandes injeções de novos recursos seriam capazes de manter uma instituição ao longo de mais de uma centena de anos. E o que é uma centena de anos diante da expectativa de vida de traços culturais, traços estes que deveriam ser considerados as verdadeiras bases das instituições?

"Todo produto tem um ciclo de vida", dizem os profissionais de mercadologia
observando o histórico de vendas. Produtos, entretanto, trazem a essência da própria instituição que a produziu, o que nos faz aplicar o mesmo dogma da mortalidade às expectativas de vida da própria empresa. A pecuária também traz uma lição, que ainda não foi aprendida sequer pelos pecuaristas: criar uma espécie só intensivamente é expor o futuro de seu plantel inteiro à fraquezas típicas daquela espécie. Um dia, uma delas pode pegá-lo pelo pé, e tudo estará perdido. As pessoas que trabalham em sua instituição não estão propensas às mesmas doenças, mas suas idéias, se forem muito semelhantes, estão. Por isso, num determinado momento a conjuntura pode determinar seu fim.

Será verdade que não existe vida eterna para uma instituição?

Se não podemos ser deuses imortais, podemos ao menos aprender com as obras divinas. Ao menos vale tentar aplicar os princípios de preservação da natureza sobre as instituições pelas quais respondemos na esperança de que elas também dêem frutos por mais de quatro gerações.

Não contrate apenas gente que pense como você, contrate gente inteligente, criativa e que tenha algo novo a dizer. Promova o debate constante, recupere os contingentes de minorias culturais e busque a culturodiversidade em sua instituição. Sobretudo, não pratique a monocultura!

(*) Eduardo Wyllie, M.Sc, é fundador do E-Consultancy Workgroup.