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NOTÍCIAS 2002

Dieta de desinfoxicação

Mário Persona (*)
Colaborador

A voz no telefone era do repórter de um grande jornal. O terceiro, além de uma revista e outro jornal, a me entrevistar sobre o tema "A perda do tempo causada pelo excesso de informação". Um problema tão sério, que vou dar aqui minha contribuição. Ao terminar de ler, você estará cinco minutos mais magro.

Quem viaja aos EUA descobre por que Holywood decidiu adotar o widescreen, ou tela larga. Se a população norte-americana continuar engordando, vão precisar de mais espaço para colocar os artistas na tela. Se a crise não atrapalhar, iremos pelo mesmo caminho.

Embora a moda do restaurante por quilo já tenha chegado aqui, o problema lá é o padrão de pesos e medidas que adotam. Para cada trinta gramas de arroz e feijão que o brasileiro come, o americano come uma onça. Quem não engorda com uma dieta dessas?

Mas se peso a gente perde, tempo a gente não ganha. Perde tempo quem pensa que a tecnologia faz ganhar o que é impossível criar. O que a tecnologia faz é encher a mesa de opções que nunca cabem no pires que temos na mão.

Isso até nos agrada. Nos dá uma falsa sensação de onipresença, onipotência e onisciência. Enquanto vivemos à beira de uma onifalência nervosa, com dois olhos e dois ouvidos tentando absorver tudo o que um único cérebro jamais irá processar.

Antes cara, o assédio da tecnologia hoje barata não pára. Em casa, no carro, na empresa, no bolso, no pulso, estamos imersos nela. Acreditamos que, do nada, ela crie mais tempo para comer, beber e descansar. Por isso queremos sempre o último modelo de canhão, ainda que só para caçar passarinhos.

Enquanto os passarinhos esperam, passamos dias lendo o manual, examinando o CD-ROM e procurando na Internet como configurar. Quando Einstein disse que "tudo deveria ser feito da forma mais simples possível, mas não mais simples do que isso", será que falava de tecnologia?

Assédio excessivo - O excesso de tecnologia nos leva a outro excesso, com direito a rima: Excesso de acessos. As possibilidades de acesso excedem a imaginação do mais assíduo e excêntrico asceta. Exceções à parte, somos assediados, enquanto assediamos, numa escala em excepcional ascendência. Acabo de ter um acesso de excessos!

Com a Internet, tenho acesso imediato a milhões de pessoas, deste planeta e fora dele, se tiver alguém atendendo na estação espacial. E a recíproca também é verdadeira. Milhões de pessoas podem agora mesmo entrar em contato comigo para comprar meus serviços. Espero que venha uma por vez.

Excesso de tecnologia, gerando excesso de acessos, criando excesso de informação. Para ser lida, digerida, cuspida ou respondida. E ainda nem falei do telefone, fax, celular, pager, interfone do prédio e crianças de dois anos. Todos exigindo resposta imediata.

Essa urgência o e-mail conseguiu incorporar, graças à nossa curiosidade natural. Preciso responder logo para não morrer de vontade de saber o que meu correspondente irá responder. Provavelmente num e-mail com links. Ah! Os links!

Acabei de criar um. Fez você correr para este parágrafo. É assim que funciona em redação, é assim que funciona na Internet. Links são fios de infinitas meadas interligadas numa trama contra nós. Quem passou a vida enrolando, hoje navega desenrolando. Quantas páginas você visitará na Web antes de se dar por satisfeito?

Sem interrupção - Só o Google.com tem hoje 2.073.418.204 páginas registradas, uma fração da Web. Se conseguir visitar uma por minuto, passarei os próximos 3.944 anos navegando. Isso se ninguém me interromper com e-mails ou mensagens de ICQ.

Quando terminar, mal terei tempo para uma corridinha ao banheiro e já haverá um número infinitamente maior de opções de tecnologia, acesso e informação à minha espera. O que nos leva a outro problema.

Excesso de trabalho. Processar tudo exige trabalho. É preciso autocontrole. Passamos da fase de primeira vez em restaurante por quilo. É hora de dizer não ao excesso de tecnologia. Para evitar o excesso de opções, acesso, informação e trabalho. De tanto excesso, me estresso! Estou confuso! Já nem sei mais se escrevo com cedissa ou dois elhes!

Por isso decidi escrever esta crônica à luz da janela e usando um bom e velho lápis. Nada de computador ou Internet. Uma tarde de desinfoxicação, livre do vício tecnológico. Se conseguir fazer minhas mãos pararem de tremer por causa da abstinência tecnológica. Esse apagão! Quando será que a energia vem?

(*) Mário Persona é consultor, escritor e palestrante. Esta crônica faz parte dos temas apresentados em suas palestras. Edita o boletim eletrônico Crônicas de Negócios e mantém endereço próprio na Web, onde seus textos estão disponíveis.